Sobre Impérios e Filhos de Deus
CROSSAN, John
Dominic. The Birth of Christianity: discovering
what happened in the years
immediately after the execution of Jesus. Nova Iorque : HarperSanFrancisco, 1998. 653p.
O mundo no qual viviam os primeiros
cristãos não separava o Estado e a Igreja, o divino e o humano, o eterno e o
temporal, o Céu e o Hades. Pessoas alegavam parentesco com deuses ou ter visto
mortos voltarem e ninguém se espantava com isso. Os primeiros cristãos afirmavam
que Jesus era filho de Deus e ressuscitara. Mas não era isso que o tornava
especial. Se você pudesse escolher seu Deus, quem você escolheria? Augusto, o
Imperador Romano, filho do deus Apolo, apoiado por imensa riqueza e poderio
militar, ou Jesus, um camponês judeu pobre o suficiente para nascer no estábulo
de outra pessoa? Faça sua escolha – é o apelo do autor.
O biblista e historiador irlandês
John Dominic Crossan combina uma erudição quase pantagruélica com um senso de humor
que explicam o sucesso de seus escritos em busca do Jesus Histórico. Sucesso e
controvérsia: este ex-padre casado tem sofrido acusações até de ser ateu. Neste
fornido volume ele continua seu percurso de caracterização de Jesus como um camponês
mediterrâneo. Jesus teve sua vida pública e morreu nos anos 20 do primeiro
século, e todos os escritos tratando disso datam de épocas posteriores. Paulo
escreveu suas epístolas nos anos cinquenta, e disso há escritos da própria
época. O que aconteceu nesses primeiros trinta anos do Cristianismo – é a questão
que o livro pretende decifrar.
Baseado neste método o autor transporta
o leitor para um ambiente muito específico – a Judeia do tempo do Rei Herodes
Antipas. O Império Romano trouxera urbanização e comercialização, e essas duas
novidades significaram desastre para os camponeses pobres. O judaísmo tradicional
adorava um Deus de Justiça – o protetor das viúvas e dos órfãos, como não cessavam
de trombetear os profetas. A nova ordem transformava a terra em objeto de
comércio, e pressionava os camponeses ao pagamento de tributos para sustentar
as novas cidades que pululavam. O tempo nada tinha de plácido – amontoavam-se os
famintos.
Nessa época e lugar dois
movimentos surgiram, liderados por profetas itinerantes: o Movimento do
Batismo, de João Batista, e Movimento do Reino de Deus, de Jesus. Este pregava um
Deus diferente dos da época: o Deus não-violento de um Reino não-violento, um
Deus de resistência não-violenta ao mal estrutural do Império Romano e ao mal individual
que proliferava dentro deste.
O Jesus de Crossan não flutua
sobre a Terra. Nem sequer a visitou para viver entre os homens. Ele é homem,
inteiramente: sofre a opressão do tempo e procura solução para ele. Trata-se de
ponto de vista não isento de opositores. De qualquer forma é visão erudita e
fecunda para tentar decifrar o enigma Jesus.