Antídoto contra o perigo
Paulo Avelino
Quando o perigo vem, o animal
foge. Mas quando aquele o surpreende, o bicho se paralisa na esperança de que o
mal suma. Esse é o autoengano. Há também a denegação: saber que as coisas
existem mas pensar que não são tão ruins assim.
Esse ensaio do professor Luiz Marques
pode ser lido como um antídoto contra essas duas atitudes. Trata-se de aposta
ousada: afinal é vasta e crescente a literatura sobre os problemas ambientais,
particularmente sobre o aquecimento global. E seu autor não é o climatologista
ou biólogo que se poderia esperar, mas um historiador de arte renascentista
italiana.
Com tudo isso Luiz Marques explorou
competentemente o assunto. Realizou pesquisa abrangente em assunto tão amplo e
seu livro apresenta atração adicional para o leitor de 2019, que é a de ter
sido recentemente atualizado. Livros sobre a crise ecológica caem rapidamente
na obsolescência.
A primeira parte traça um
panorama enciclopédico do estado do ambiente hoje e se denomina “Convergência das
crises ambientais”, pois se trata exatamente disso. O problema não é só a
emissão de gases de efeito-estufa na atmosfera, causando o chamado aquecimento global.
A diminuição das florestas, o declínio dos recursos hídricos, o depósito de
lixo nos oceanos, o colapso das biodiversidades aquática e terrestre, tudo compõe
um mosaico que aponta para um Antropoceno e uma hipobiosfera, ou seja, um
planeta moldado pela presença humana e com menor riqueza biológica.
Surpreende a recorrência de
problemas que normalmente se supõem superados ou ao menos equacionados. O recente
aumento do uso do carvão como combustível, quando se sabe que é um dos principais
causadores da mudança climática. Também a revisão das previsões anteriormente otimistas
quanto ao decréscimo da taxa de aumento demográfico, que faz com que o momento
do zero crescimento seja empurrado cada vez mais para o futuro. E o aumento da
taxa de destruição da floresta amazônica, já perceptível quando o livro foi
escrito.
A segunda parte procura dar um
sentido e uma saída a toda essa miríade de problemas convergentes. Para o
autor, a crise atual parte de três ilusões concêntricas: primeiro, a ilusão de
um capitalismo sustentável – qualquer tipo de crescimento não é mais possível; segundo,
a noção de que quanto mais excedente, mais segurança, compreensível em uma
espécie que passou privações tanto tempo, mas que se revelou falsa; e finalmente
a ilusão antropocêntrica, de caráter filosófico, que crê ser o Humano o pináculo
dos seres, com todos os outros inferiores a ele, e podendo se servir deles de
acordo com as conveniências humanas.
Resta a saída. O autor dá apenas
pistas. A lógica de acumulação não pode mais ser mantida – não se quisermos preservar
o planeta o mais habitável possível. E não faz diferença se a lógica acumulativa
se encontra em empresas privadas ou em economia socialista. Para tanto é necessária
uma redistribuição de poder. Caminhos difíceis, e talvez inevitáveis.