A República vai à Escola
DARCOS, Xavier. L´école de Jules Ferry: 1880-1905. Paris: Hachette Littératures, 2005.
293p.
Um político francês chamado Jules Ferry empenhou-se
em estabelecer leis que regeriam algo que não existia antes, o ensino público
obrigatório. Mais de cem anos depois o também político e também devotado a
Educação Xavier Darcos escreveu esse livro sobre as condições concretas de vida
na escola deste pioneiro republicano. Darcos utilizou amplamente na obra sua
experiência como antigo Ministro delegado do Ensinamento Escolar no governo
francês.
No Brasil discute-se a Escola. E se discute e se
discute. Os Governos exaltam os docentes em homenagens no Dia do Professor. Este
último faz greve e leva pancadas da polícia. Prefeituras distribuem tablets. E
os sucessivos fracassos do aluno nacional em comparação com os de outros países
passam mansamente pelos jornais.
Na França de 1880 também se discutia. Havia no
entanto um ingrediente esquecido no Brasil de hoje. Neste se enfatiza a educação
como direito do jovem, particularmente do pobre; como fator de redistribuição
de renda; como corretor de antigas injustiças. Quase não se fala na Educação
como interesse de Estado.
Jules Ferry estabeleceu em 1880 e 1881 em duas leis
que as comunas francesas deveriam dar educação primária a todas as crianças. E
que estas tinham a obrigação de ir à escola. E que o ensino que receberiam nada
teria de religioso.
Não fez isso por ser bonzinho. O republicano exaltado
Ferry sabia que o poder de seu grupo corria perigo. A República mal tinha dez anos,
duramente completados após a derrota militar para a Alemanha em 1871. Combatida
pelos saudosos do Império e pelos católicos, a República precisava de uma
saída.
Encontrou uma. A generalização de uma instituição
pela qual todos os franceses precisariam passar, quando crianças e jovens. Nela
aprenderiam a ler, escrever, que eram cidadãos de uma República que lhes
assegurava direitos, que deveriam morrer por ela em guerras e que a religião
era assunto a tratar apenas em suas casas e templos.
Para isso havia um agente básico. O professor. Para
formá-lo, em cada região da França foi criada uma escola normal. Para formar os
professores das escolas normais, foram criadas duas escolas normais superiores.
Os rapazes e moças destinados ao ensino viviam em internato nessas escolas
normais, semimilitares, sóbrias, até tristes.
Saíam de lá para ensinar nas pequenas comunas de um país
quase todo agrário. Sérios, conscientes de ser o portador do saber em uma população
de muitos analfabetos. Cada um deles uma pequena autoridade em seu lugar. Usavam
um longo uniforme preto, semelhante ao da cavalaria hussarda. Ficaram
conhecidos como os Hussardos negros da
República.
Cumpriram bem sua missão. A França nunca mais se
tornou Império.
Esse livro pode lembrar ao Brasil de hoje que educação
não é lacrimoso assunto de piedade para com as criancinhas. Nem mesmo,
primariamente, meio de fazer os pobres deixarem de sê-lo. Trata-se de interesse
do Estado, de sobreviver como tal. Isso pode levar outro nível ao debate sobre Educação.
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