terça-feira, 27 de agosto de 2013

De Consumidor a Cidadão, de Albert Hirschman

Gritando de máscara contra a Copa


HIRSCHMAN, Albert. De Consumidor a Cidadão: atividade privada e participação na vida pública. São Paulo: editora brasiliense, 1983. 145p.

O economista germano-estadunidense Albert Otto Hirschman não participou das passeatas que sacudiram o Brasil em junho de 2013, mas poderia. Ele se intitulava um eterno dissidente –esse é o nome que ele se deu nas suas memórias. O Brasil não lhe era desconhecido – citava o país com frequência em seus livros. Ele nos deixou há pouco (morreu em dezembro de 2012) e legou este pequeno ensaio sobre o que motiva um indivíduo a sair da vida meramente individual para a participação política, e que o leva a percorrer o caminho inverso.

O autor procura um modelo que seja a um tempo cíclico e endógeno – as mudanças de comportamento dependeriam mais de uma dinâmica própria que de qualquer fator externo, e não teriam necessariamente um fim. A decepção é o fator central da sua tese.

A vida de viver só para si e para a família, sem se meter em política, greves, partidos ou outros bichos tem seus encantos mas há serpentes nesse mato. O s bens se dividem entre os que são destruídos no ato do consumo e os que não o são. Os primeiros têm a vantagem de decepcionar menos. É difícil por exemplo decepcionar-se muito com comida – logo depois vem outra refeição e a experiência má logo é esquecida. Já um carro - que depois de comprá-lo descobrimos que podíamos ter comprado um melhor por um terço a menos do preço -permanece como espinho.

E os bens duráveis também se podem dividir. Há os que são usados todos os dias – e estes, passado o período de sua aquisição, não causam mais nenhum prazer – embora causem decepção quando falham. Os bens que são usados de forma mais ou menos rara, como máquinas fotográficas, podem causar mais prazer, o que não os impede de também decepcionar.

E o problema: depois de imenso esforço o indivíduo consegue utilitário esportivo e compras em Miami, e então paira a terrível pergunta: E daí??

A vida pública pode ser uma resposta. Mas esta tem também suas arapucas. A participação política devora o tempo da pessoa. E os resultados são muito aquém das expectativas– estas são sempre exageradas. Todo militante sonha com mudanças radicais e negligencia as menores, que são as que ocorrem. E os movimentos políticos têm uma lógica própria, e frequentemente escapam do controle de seus iniciadores, o que também gera decepção.

Quem não tem bens quer apenas tê-los. Quem os tem é que se decepciona. E quem se decepciona é quem se revolta. A centralidade da decepção também explica que são os decepcionados que se revoltam, não os destituídos. Semelha com certo país cujas condições melhoraram um pouco e a população talvez por isso estourou em passeatas.

O autor não se propõe a resolver a questão. Aponta que tudo talvez tenha como fonte uma separação por demais radical entre o privado e o público, e uma convergência dos dois talvez fosse uma solução. #Ficaadica. De qualquer forma lendo o livro às vezes dá a impressão de ver o autor caminhando para o Mineirão ou Maracanã, vinagre no bolso e máscara na cara, gritando Abaixo a Copa.

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